UM AMOR DE VIZINHO

Maya se casou e foi morar num prédio grande com vários blocos. De início teve medo. Muita gente, corredor com oito apartamentos por andar, mas o preço do imóvel estava bom e não era para se desperdiçar uma oportunidade como essa.

Foi após o nascimento dos filhos que ela pode comprovar o quanto havia sido bom a compra do apartamento. O playground era bem espaçoso com duas piscinas, uma só para bebês sem falar na segurança de deixar os filhos brincarem despreocupadamente num lugar seguro e limpo.

Os filhos de Maya cresceram se casaram e se mudaram de lá. Seu casamento também acabou e de repente ela se viu sozinha. Não desanimou. Contratou um arquiteto e pos a casa abaixo. Entretanto, muda para o apartamento ao lado, um casal com uma filha ainda de colo. Chegaram já incomodando. Muita gritaria no dia da mudança e muito lixo deixado no corredor. Maya não gostou, mas não reclamou.

- Afinal é o primeiro dia deles. Vou ficar de olho pra ver se acontece novamente.

E aconteceu. O corredor antes tão limpo, agora sempre estava sujo. E para piorar o novo vizinho não era um cara simpático. Era incapaz de responder a um simples cumprimento. Ouvia música alta e suas discussões com a mulher um entrave para o sossego que Maya desfrutava antes deles irem morar no andar. Ela foi reclamar com o síndico, que disse nada poder fazer, pois o barulho se dava em horário permitido por lei. Maya tentou argumentar que sabia disso, só que a música era tão alta que ela não podia ouvir mais nada. Meses depois começaram as brigas com a mulher. Ouvia-se de bofetões a ais de dor e desespero. Maya ligava para o porteiro, para o síndico e ninguém queria intervir. Um dia resolveu ligar para a polícia. A polícia veio, mas a briga já tinha acabado. O vizinho desconfiou de Maya. E então, declarou guerra à sua vizinha. Separou-se de sua mulher, e ficou com o apartamento só para ele. Levava mulheres para lá e as orgias duravam toda a madrugada, com música alta e copos quebrando. Maya não conseguia mais dormir tal a barulheira. Ligou para o síndico várias vezes e não obteve ajuda. Ela pediu a solidariedade dos outros vizinhos, que também se sentiam incomodados com a balbúrdia que vinha do apartamento 503. Todavia os vizinhos tinham medo.

-Soubemos que o cara usa drogas. Tô fora. Sei lá, se ele cisma com a gente. Tenho filha pequena pra criar.

-Áh, Maya, ele me perturba, mas tenho medo. Ele pode de raiva, riscar o meu carro.

-Não é tanto barulho assim, Maya. Deixa pra lá. Um dia ele muda.

Os vizinhos tiraram o corpo fora. E a guerra continuava. Ele comprou dois cachorros pitbulls e levou-os para o apartamento. Maya viu o dia em que os cachorros chegaram e ligou para o síndico.

-Não é possível, você tem que fazer alguma coisa. É proibido pitbulls no prédio. Cachorros ferozes, uma mordida e acaba com a gente.

-Só posso interferir se os cachorros morderem alguém.

Maya notou que seu vizinho se ausentava do prédio por alguns dias, deixando os cachorros presos. Quando voltava os soltava no corredor, e ela não podia sair de seu apartamento. Ligou para o síndico em pânico.

- Desça agora e venha até o meu andar.

E mais não disse.

O síndico desceu e quando viu os cachorros, fechou a porta do elevador e subiu para o seu apartamento. Ligou para Maya.

-Você tem razão, Maya. Os cachorros me intimidaram. Se não fecho a porta rápido, acho que comiam o meu pé.

Finalmente, o conselho do condomínio se reuniu para expulsar o condômino indesejável. O síndico, que a princípio achava que a reclamação de Maya era exagerada- Coisas de mulher na menopausa-, agora era o seu maior defensor. Escreveram cartas para a mãe do indesejado, contando em detalhes o comportamento do filho no prédio. Soube-se inclusive, que ele era sustentado pela mãe, e que nem emprego tinha.

Passaram-se nove anos até que conseguiram que ele se mudasse. Maya ficou aliviada. Mas levou um susto, um dia desses, quando o viu malhando na mesma academia que ela freqüenta. Ele passou por Maya e a encarou com raiva e deboche. Por precaução, ela mudou de horário. Também tinha medo dele.

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