domingo, janeiro 28, 2007

A CASA


Era uma casa sem memória. Totalmente vazia e triste. Abandonada há décadas, estava desfigurada, com infiltrações em todos os cômodos, paredes desbotadas e manchadas, portas quebradas e o reboco do teto despencando.

Eu conhecia a casa. Afastada das demais, sempre me chamou a atenção pela sua localização: no alto de uma ladeira íngreme, no final da rua. Poucas pessoas se aventuravam a ir até . A subida afastava qualquer pretensão. Diziam que era assombrada. Houve um tempo em que ela foi habitada, porém pouco víamos seus ocupantes. Saiam e entravam num grande carro preto. Gente de posse. O portão da frente, de madeira e imponente, abria e fechava por controle remoto, e a murada que a cercava era muito alta. Viviam totalmente isolados. Várias estórias surgiram por conta dessa curiosidade. Inventava-se muito, mas a verdade é que não sabíamos nada sobre aquela família.

Foi numa tarde quente de outono, que vimos pela primeira vez, o portão ser aberto para dar lugar a um caminhão de mudança. Todos nós ficamos inquietos, pois era uma oportunidade única de bisbilhotar os segredos daquela casa. Nos foi permitido ver muito pouco, mas o que vimos nos maravilhou. A casa, de dois andares, era espetacular com um jardim imenso e cercada de árvores frutíferas. Os móveis estavam arrumados dentro do caminhão, e a empregada dava as últimas instruções. A porta do caminhão se fechou, o motorista deu a partida e nós corremos ladeira abaixo.

Hoje vim ver a casa. Um espectro daquilo que foi. Uma boa reforma vai sair caro, mas talvez valha a pena. Tento descobrir, andando de cômodo em cômodo vestígios daquela família, alguma coisa que os lembre. Nada. È uma casa sem rosto. Espaçosa e ampla meus passos ecoam pelo assoalho maltratado pelo tempo. O eco, a princípio, me incomoda, mas depois de alguns minutos, soa como música aos meus ouvidos.

Tenho a atenção desviada por um solo de saxofone, no andar superior. Alguém toca Wave, de Antonio Carlos Jobim. Sempre gostei desta música. Deixo-me levar pelo som do saxe e vou subindo as escadas. O som fica mais forte à medida que me aproximo. Procuro nos quartos, vazios, o solista solitário. A música, cada vez mais alta, começa a me incomodar. Dou um grito. A música pára. O silêncio volta a reinar. Começo a andar. Agora apenas o som dos meus passos. Sinto um frio na boca do estômago, e uma lufada de vento desarruma meus cabelos. Escuto vidraça se estilhaçando. Vou em direção do barulho. No chão de um dos quartos, estilhaços do vidro da janela. Não me lembro de estar ventando. Tempo mais maluco, esse. A música volta, forte, o saxe, desesperado chora no tema. Desço as escadas correndo e tropeço numa taboa solta. Rolo em cambalhotas e penso comigo que morri. Não vejo mais nada. Depois de um tempo, escuto uma voz ao longe, que se aproxima do meu ouvido e me sussurra coisas banais. Sou sacudido e me imploram para abrir os olhos. Não abro. Quero me ver livre da música. Ficar em paz. Vejo um carro enorme vir na minha direção. Vermelho. Em alta velocidade. De onde saiu esse carro? Vou morrer. Dou uma cambalhota e saio do alvo. A queda foi inesperada. Nunca havia caído da cama até aquele dia. Alguém na vizinhança escuta Antonio Carlos Jobim: Wave.

terça-feira, janeiro 16, 2007

LIVROS NO NINHO

Vejam abaixo e leiam os livros na íntegra:

  1. BALAIO (poemas)
  2. CONTO ENTRE CONTOS (contos)
  3. NA MEDIDA (contos)
  4. NEM TANTO NEM TÃO POUCO (contos)
  5. EM TRÂNSITO (contos)
  6. O NINHO DE MATILDE (infantil)

quinta-feira, janeiro 11, 2007

CINEMA: O ILUSIONISTA e O AMOR NÃO TIRA FÉRIAS

Amo cinema, ainda mais se o filme é bom. O ILUSIONISTA de Neil Burger, é fenomenal. Traz um extraordinário Edward Norton, pra mim, um dos mais talentosos atores de sua geração, na pele de um mágico no início do século passado. O filme, muito bem contado, vai evoluindo para um final surpreendente. Edward Norton dá um show de elegância e talento.

O AMOR NÃO TIRA FÉRIAS é uma comédia de costumes deliciosa. Um quarteto de atores bonitos num cenário sofisticado que me fez ver o quanto minha vida está sem glamour. O cinema tem esse dom: abusar da fantasia e pintar tudo com tintas que não estão à venda. Mas que a gente sai leve do cinema, isso sai. E esse foi o objetivo.

sábado, janeiro 06, 2007

MANDEI ESSE DESABAFO PARA O GOVERNADOR SÉRGIO CABRAL

O DESCASO PÚBLICO EM RELAÇÃO À BIBLIOTECA ESTADUAL

Vejo o governador eleito se esforçar, em todas as direções, para fazer um governo de coalizão que beneficie o Estado do Rio de Janeiro, abandonado por sucessivos mandatos, tanto no âmbito municipal, quanto no estadual. Leio também que haverá cortes e redução de custos nos primeiros anos para compor o caixa desfalcado, deixado pela dinastia Garotinho. E que nãodinheiro para novas obras, e quem sabe até para honrar o pagamento do funcionalismo público na virada do ano. A prioridade é concluir as obras em andamento e a preocupação é a conclusão das adaptações do Complexo Esportivo do Maracanã para o Pan de 2007. Ninguém falou e muito menos lembrou do descaso público em que se encontra a Biblioteca Pública Estadual. LIVROS SÃO PATRIMÔNIO DA HUMANIDADE.

Sou funcionária pública concursada, sem cargo e sem padrinho político.

Bibliotecária, trabalho na Biblioteca Estadual, vinculada à Secretaria Estadual de Cultura. O prédio está decadente por fora e por dentro, precisando de obras emergenciais por conta de sua estrutura deteriorada e cheia de infiltrações. Tudo falta na Biblioteca, do mobiliário a pessoal categorizado. O salão de leitura é uma poça de água constante. Plásticos são espalhados por cima dos livros quando chove e no chão também, que é revestido por um tapete fétido, roído e cheio de bactérias, por conta da água da chuva. Goteiras proliferam em todo o prédio. A sujeira entranhada nos livros é de dar : entra pelas janelas escancaradas, que deveriam ser fechadas. Bibliotecas funcionam em salas refrigeradas. Mas os arquitetos não pensaram nisso. As janelas do Salão de Leitura, em forma de persiana, estão emperradas, sujas e dificultam a circulação do vento num andar que é um forno crematório nos meses de verão, uma vez que o prédio é de concreto armado. As poucas bibliotecárias do andar usam luvas e muitas até máscara (as bibliotecárias contratadas para a informatização). O belo auditório está fechado por não haver condições de uso. Há vasos sanitários rachados e banheiros com portas internas frágeis.

O último concurso para bibliotecários foi em 1968, do qual participei. O futuro secretário de cultura fala em projetos compartilhados com outros municípios, e incrível, não fala das obras na Biblioteca

Relatórios são feitos pedindo atenção e ação do governo e sistematicamente são postos de lado. Alegação: falta de dinheiro. A atual direção, competente e esforçada (leia-se Ana Lígia Medeiros) leva o barco, mas milagre ela não pode fazer. Redige relatórios pedindo a completude das obras, que foram realmente iniciadas, mas pararam no meio. A dinastia Garotinho deve ter achado que as obras assistenciais é que rendem voto. E político precisa do voto de cabresto para se eleger.

A Biblioteca bravamente resiste. Pelo pulso firme de Ana Lígia realizam-se eventos, exposições e cursos livres.

São menos de 50 as bibliotecárias da Secretaria de Cultura. Não houve renovação de pessoal especializado. A seção infantil da Biblioteca está fechada por não haver bibliotecários para assumir as funções. Claro, que o Senhor Governador deve saber que os salários estão defasados, e queum plano de cargos e salários, que passou na Alerj, quando o senhor era presidente e que equiparava nossos salários ao pessoal do Teatro Municipal com as mesmas atribuições. Nem a governadora Benedita, nem a governadora Rosinha se incomodaram em rever os tais planos. O salário base de um bibliotecário é de 280 reais. Há os encargos, mais a produtividade de mil reais que não é incorporada quando da aposentadoria. Então, ao se aposentar, o contra-cheque do cidadão bibliotecário, de nível superior, não chega a mil reais. Não pode, não é mesmo, Senhor Governador? É humilhante, o senhor concorda?

Que o senhor faça um bom governo, e atente para a Biblioteca Estadual e para a situação do bibliotecário, tão importante quanto o professor e o médico.


JEITINHO CARIOQUINHA DE SER

carioquinha

sou, sim senhor

fruto desta terra tropical

anarquista por natureza

mas malandro por opção

hay ley, soy contra

no meu pedaço é assim

não leu, o pau comeu

bato, tripudio, escarro em cima

e ainda saio coçando o saco

mas matar

não mato não

sou um cara respeitoso

trabalhar?

faço é furtos oportunos

cada um se vira como pode

mas é na praia

que me solto pra valer

não tem essa

nem de rico nem de pobre

é o marzão

e esse

jeitinho carioquinha de ser