Não há nada melhor do que boa literatura, melhor
até do que um bom filme, porque o leitor viaja no seu próprio filme seguindo o
roteiro do escritor. Deu pra entender?
Vou começar pelo Daniel Galera: Barba ensopada de sangue.
Já o conhecia de uma coluna no Jornal O Globo, mas uma companheira de academia,
que esteve na Suécia, me contou que o seu anfitrião lia o Galera em sueco e
estava entusiasmado pelo escritor brasileiro. Ela comprou o livro acima citado,
amou e me emprestou. Cruzes, credo, ave-maria, o livro é espetacular. O
escritor de 30 anos mostra um amadurecimento precoce para a idade que tem pelo
conflito interior que ele levanta. A narrativa é densa, penetra nas profundezas
da existência do personagem, em busca do avô, para entender, quem sabe? ( esta
é a minha viagem) a própria existência. O sujeito, professor de educação
física, vai para Garopaba, no litoral catarinense, com a cachorra do pai, que
se suicidou, e também para conhecer a história do avô, que teria morado por lá
e morrido assassinado. Trama instigante dando vez ao mistério que permeia toda
a narrativa, que é muito bem entrelaçada. Os diálogos são ótimos, e através do
que é contado tomamos conhecimento da vida no balneário e da desconfiança dos
moradores com quem vem de fora. O personagem tem uma patologia estranha: não
tem memória visual e se esquece rápido das fisionomias das pessoas e isso causa
estranheza e desconfiança nas pessoas. Já no final do livro, quando ele se aventura pelas
trilhas, em busca de seu avô, é quando a narrativa atinge o seu ápice, porque
descreve todo um sofrimento do personagem atravessando obstáculos, caindo e
levantando e levando a gente junto com ele, para finalmente atingir o seu
objetivo. Sem falar na descrição da natureza selvagem ao redor, onde ele usa a escrita com muita beleza. E Galera deve gostar de cachorros, porque cai de amores por sua Beta
e sofri muito com os seus percalços. Mas tudo sai bem no final.
E agora Cristóvao Tezza, O Professor. Dele já tinha lido O Filho Eterno, que me cativou, me
fazendo escrever pra ele e obtendo resposta, olha que máximo. Tezza é uma
figuraça, risonho, engraçado, pra mim está entre os melhores escritores
brasileiros. Mais velho que Galera, acho que duas gerações, seus dois livros
são excelentes, e acredito que os outros também. Tezza é gênio, sua literatura
é de altíssimo nível, este livro - O
Professor - trata de um dia na vida de um velho professor que vai receber
uma homenagem na universidade pelos seus anos de trabalho. Pois bem, esse
escritor maravilhoso nos vai pondo a par da vida do professor, dos seus
conflitos íntimos em receber o prêmio. da barreira que criou com o filho, da
morte da mulher, do amor por Therése, e também ao encarar a própria finitude, A
narrativa vai e volta no tempo com tal maestria que é impossível não se
envolver. Tezza é sofisticado, um escritor elegante que nos brinda com uma
literatura de alto nível.