DOIS IRMÃOS- A SÉRIE DA GLOBO
O livro de Milton Hatoum é extraordinário, como são todos os seus livros. Não tem grande produção literária se compararmos com Tezza, outro escritor do mesmo calibre, mas a série da Globo, produzida a partir do seu livro foi excelente, como é sempre; o padrão Globo de qualidade existe mesmo, de verdade.
Adorei tudo, acho que os atores deram shows individuais, cada um com o tamanho de seus personagens.
O livro tem três vozes eu acho, e assim foi a série, narrada por um timbre soturno de Irandhir Santos, quem sabe vocalizando o mistério dos povos árabes. Foi um achado da direção e ainda mais com este ator maravilhoso, tantas vezes premiado. Passou o tempo todo como observador, pois é ele quem escreve o drama de sua família, sim, porque tudo leva a crer que é filho de Yahub. Ou seria de Omar, depois daquele estrupo? Fica a dúvida. Pausas e silêncio, adoro isso, a verborragia por conta de Zana, aliás faço reverência à esta dama do teatro, Eliane Giardini, que no último capítulo emocionou. Se não fosse a atriz que é, resvalaria para um dramalhão, mas a direção segura e o talento da atriz possibilitaram cenas inesquecíveis.
Antonio Fagundes não precisava incorporar um Halim tão decrépito. O corpo atual do ator já era suficiente para o papel, mas fumar aquele narguilé o tempo todo, foi dose, mas como é um outro ator excepcional deve ter agradado mais do que o contrário. Foi legal ter um descendente de libanês fazendo um papel que remeteu às suas origens. Aliás poderia ter mais gente com cara de árabe. Bem, nossos atores judeus preencheram esse vácuo.
Os tons do seriado me encantaram. Realmente pintaram uma Manaus mágica (embora ache que deve ser um tormento morar num lugar tão quente, cheio de mosquitos e com tanta água caindo), com aquela natureza quase que à beira das casas, rios, folhagens tão lindas em tons de verde. Cenas verdadeiramente sensuais com pouca roupa, água e o erotismo no ar. Sensibilidade da direção. Palmas.
A música de Tim Rescala teve força tamanha que no primeiro capítulo engoliu as cenas.Vi-me ouvindo a música e quase que não prestando atenção ao que via.
Depois de um primeiro capítulo de apresentação, quase que alegórico, faltou pouco, o que nós vimos foi um espetáculo de altíssimo nível técnico e artístico. Todos estavam espetaculares. Realmente concordo com Cauã Reymond, ele ganhou o papel de sua vida. Encarnou os gêmeos tão bem, que por vezes me levantava angustiada com o que via. Os meninos e o adolescente que personificaram os gêmeos foram incríveis também, o adolescente então, era igual ao Cauã.Me impressionou sua garra. Tão bom ver ator novo, eles normalmente se empenham tanto e de uma forma tão natural, sem vícios, que temos mesmo que aplaudir.
Juliana Paes sempre é um refresco para os olhos, embora ache que sempre ri demais. Já conhecemos todas as facetas do belo sorriso da atriz, mas chorou demais, resvalou um pouco para a chatice, mas suas cenas desnudas devem te feito um bem a muitos olhos ávidos. Compreendeu o papel depois do primeiro e segundo capítulos, e fez muito bonito.
Domingas - boas atrizes, as duas. No silêncio que diz tudo, a atriz índia deu show.
Lívia- esta passou sem dizer a que veio. Acho que foi a única que apenas passou. Não deram a ela nenhuma fala interessante, e sua presença foi quase desnecessária. Na cena em sua casa, depois da depredação de Omar, o que eu vi foi uma atriz apenas marcando presença. Será que era isso que o diretor queria? Foi o único senão.
Yahub trouxe nos olhos o mistério do povo libanês. Poucas palavras, o sentimento dentro da alma. Urdiu em silêncio a revanche contra Omar. Halim, na pele do admirável Antonio Calloni trazia esse mistério, também. Ele olhava para a mulher e pressentia a tragédia cada vez mais próxima. Sem dizer quase nada, mas apenas com olhares, Calloni/Halim passava o ódio/amor tão presente na cultura árabe. O desenrolar das cenas, do fausto à miséria, a saga daquela família mexe com os nervos. É duro de assistir a degradação do ser humano, quando ele ainda tem uma vida pela frente e que não soube usufruir, por conta de ódios, rancores.
No último capítulo, a casa sendo destruída é uma metáfora para aquela família também tão destruída.
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