A MINHA CONVOCAÇÃO PARA O TRIBUNAL DO JURI

Fui sorteada para comparecer ao II Tribunal do Juri para servir de jurada popular para o mês de agosto. Soube que o cidadão entra no Tribunal às 13 horas e não tem hora para sair. Não ficou claro se oferecem almoço, mas a pergunta da funcionária querendo saber se todos estavam almoçados, me intrigou. É a segunda vez que sou intimada para lá comparecer. Desta vez, escrevi uma carta de protesto que vocês vão ler logo abaixo. O juiz, Paulo de Oliveira Lancelott Baldez, me declarou inadequada para o nobre ofício, dizendo que eu não reunia as qualidades mínimas para exercer o meu julgamento, e pedindo a exclusão definitiva do meu nome da lista. É direito dele de pensar assim, nem vou contestar, mas fiquei MUITO FELIZ de ter escapado dessa aporrinhação.
Na íntegra o meu depoimento de cidadã.
Pela segunda vez, meu nome foi lembrado para o Tribunal do Júri. Na primeira vez estava operada e entrei com recurso óbvio.
Desta vez, inovaram. Ao invés de telegrama, recebi um envelope branco com o meu nome escrito a caneta e um anexo de leis e obrigações, todas de 2008, que não constavam quando da primeira correspondência, que punem o cidadão, caso não compareça, cidadão esse escolhido arbitrariamente pelo departamento pessoal de sua secretaria e sem o seu conhecimento.

Sou aposentada e não quero mais obrigações na minha vida. Entrei numa zona de conforto extraordinária para os meus 65 anos e que não quero absolutamente abrir mão disso. Passei a minha vida toda tendo que engolir sapos e me sujeitando a ordens de pessoas imbecis. Trabalhei no serviço público, barnabé que sou e me aposentei com uma porcaria de salário de 1.300 reais, onde o meu conhecimento e meu estudo acadêmico não contaram e foram jogados literalmente no ralo pelos donos do poder. E por ter sido funcionária pública, meu nome, endereço e telefone deixaram de ser privados e aleatoriamente fui loteada para o Tribunal do Júri. Sim, porque é aleatoriamente. Sei como é feito. Vocês ligam para as instituições públicas, e o departamento pessoal, numa atitude autoritária e sem consultar o barnabé, decide quem vai. Quando soube que era assim que se fazia, escrevi uma carta de protesto e repulsa ao departamento com cópia para a diretoria. Numa segunda vez fui consultada se teria interesse em participar do Tribunal do Júri, e a minha resposta foi um cortante NÂO. Só não contava que o meu nome continuou nos arquivos de vocês e na falta de um outro barnabé, pinçaram a Maria Alice de novo.

Não devo nada ao Estado, e ele sim me deve muito. Deve-me dignidade e conforto financeiro, depois de anos de dedicação. Não tenho uma coisa nem outra, então, por que ser obrigada a prestar serviço de graça?

Entendi que posso recusar esse serviço do júri. As razões são mencionadas ao longo deste depoimento. Essa é a minha vontade e como tal me posiciono. Quero ter o direito de dizer isso, com todas as palavras.

Sou uma cidadã que paga os seus impostos, vê o seu salário minguar a cada ano, vê corruptos e bandidos não serem presos e vê privilégios absurdos concedidos a castas superiores.
Esta cidadã vê magistrados legislando em causa própria, parlamentares idem, com ótimos salários, reajustados periodicamente e muitas vantagens financeiras, enquanto ela vê o jogo sórdido do governo empurrando com a barriga o aumento dos aposentados, assim como o aumento dos funcionários do serviço público estadual sem reajuste há 15 anos.
Esta cidadã não acredita na justiça do seu país, é a favor da pena de morte, prisão perpétua e solitária, onde o sol não possa ser visto nem por uma nesga, e bandido bom é bandido morto.
Esta cidadã vive numa cidade cercada de violência, onde o cidadão sai vivo de sua casa e volta morto.
Esta cidadã vê os bandidos serem julgados, irem para a prisão e de lá monitorarem suas quadrilhas pelo celular. Exemplo vivo disso foi o caso recente de um dos assassinos do menino João Hélio, que, preso, comandava uma pequena quadrilha da prisão. O sistema prisional do Brasil é de uma hipocrisia a toda prova.
Esta cidadã quer mudanças no Processo Penal, enquanto houver brechas na lei que favoreçam os bandidos de alta periculosidade, para que então, haver julgamento?
Então, o que vou fazer num Tribunal do Júri? Mostrar a minha cara para quê? Se fosse para mandar o cara para prisão perpétua ou cadeira elétrica, até iria, mas para saírem daqui a alguns poucos anos e matarem, roubarem, seqüestrarem de novo?
Não, não quero fazer parte do Tribunal do Júri. É a minha vontade de cidadã que espero ser respeitada.

Comentários

Maria Laura disse…
Muito boa a sua carta, Maria Alice.
Se, com toda a sua argumentação, sobre fatos facilmente comprováveis, o Meritíssimo ainda acha que você não tem condições de exercer julgamento, então, também não sei o que seja julgar.
Beijos,
Maria Laura
Anônimo disse…
Dizem que vivemos em um país democratico, que somos livres. Mas na prática somos obrigados a votar, somos obrigado a fazer parte de um juri popular, sem se quer, ser consultados se queremos ou não. Queria entender que tipo de libredade é essa. Sou afavor do voto livre, só afavor da não obrigatoriedade de participar de juri popular, trabalhar como mesário em dia de eleição.
Vergniaud.

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