O IRMÃO


André nunca gostou de negros. E não disfarçava.

- Fedem, têm uma morrinha que espanta. E parecem macacos.

Não acreditou quando sua irmã apareceu com um negro em casa.

- Gente, esse é o Samuel. Colega de faculdade e meu namorado.

André olhou bem para Samuel, para a irmã, e sussurrou.

- Você tinha que escolher esse macaco? Será que não tinha um branquinho, assim bonitinho que nem você?

A irmã fingiu que não ouviu. Sabia que o irmão era racista. Aliás, ele era tudo de ruim. Homófono, racista, anti-semita, e ela, irmã, mesmo pai, mesma mãe, mesma educação, não entendia de onde vinha aquele preconceito todo.

Samuel percebeu que André ao chegar à sala o olhou com desdém e que alguma coisa foi sussurrada no ouvido de Sofia. Mas aparentemente não deu atenção e continuou prestando atenção ao que o pai dela falava.

- Me lembrei que a gente ficou de encontrar a Fabiana e o Jorge na frente do cinema e está em cima da hora- disse Sofia, arrastando o namorado e dando um beijo nos pais.

O namoro prosseguiu, mas Sofia nunca mais levou Samuel para a sua casa. André também nunca mais perguntou pelo namorado.

A noite tinha sido divertida. Sofia e Samuel encontraram com amigos num restaurante, depois decidiram dançar e ao raiar do dia voltavam para a casa quando tiveram o carro assaltado no sinal. Os homens usavam toucas ninjas e rifles nas mãos.

- Passem tudo, senão meto um tiro na goela.

Sofia e Samuel nem pestanejaram. Deram tudo.

Os bandidos mandaram os dois saírem do carro. Um deles ao ver Samuel começou a provocá-lo.

- O nêguinho gosta de xoxota branca, é? Qual é a diferença entre uma xoxota negra e outra branca? Tu já viu como tu fede? Como é que a branquinha tem coragem de trepar com você? Me conta.

E enquanto falava, tapeava a face de Samuel, e dava chutes no corpo dele. O sangue escorria e dois dentes saltaram de sua boca ensangüentada. Sofia pedia pelo amor de deus, que parassem. Vomitava e sentia a urina deslizando pelas suas pernas. O bandido estava mórbido de prazer. Queria mais. Gritava e encurralava Samuel de encontro ao carro. Não satisfeito mandou-o arriar as calças. Enfiou o revólver até onde conseguiu. O prazer do algoz era tanto que o desgraçado babava de prazer. Um silêncio pesado sufocava os outros comparsas. Não era aquilo que tinham planejado. Sofia ajoelhada no chão duro do asfalto, chorava e rezava baixinho. Samuel curvado ao peso da calamidade e humilhação pelas quais havia passado tinha os olhos secos e uma dor profunda no coração. O bandido se aproximou de Sofia e disse baixinho.

- Vê se arranja outro namorado. Um branquinho igual a você.

Os olhares se cruzaram e ela vomitou em cima dele. Arrastou-se até o namorado, abraçou-o e simulou um desmaio. Um dos bandidos, nervoso com a situação, ordenou

- V’mo embora. temos a grana e os celulares, não precisamos de mais nada.

Sofia e Samuel ficaram abraçados durante um tempo, as lágrimas e a dor se misturando. Um carro de polícia passou e os socorreu.

No dia seguinte, os celulares, e outros pertences roubados estavam intactos em cima da cama de Sofia.

Comentários

Soñadora disse…
Pegou pesado, hein?!
Final misterioso.
Unknown disse…
Realmente... o final fica por conta da imaginação hein??

beijinhos
Marcia Lomardo disse…
Gostei muito desse texto. É contundente. E real.
Parabéns pelo blog, amiga.
Você é ótima!
Bjs.

Postagens mais visitadas deste blog

O DISPENSÁRIO DA IRMÃ ZOÉ

O PREÇO DA VERDADE. FILME.

GUERRILHA NA AVENIDA BRASIL E A INCOMPETÊNCIA EXTRAORDINÁRIA DE CLAUDIO CASTRO.